Para uma vida com mais ritos de passagem diários
Acredito que é bom e bonito que os acontecimentos e as transformações na vida passem por algum tipo de rito de passagem. Celebrar uma mudança de fase, criar um ritual que marca um acontecimento, fazendo-o não passar batido e que nossos corpos e mentes percebam um novo sentido surgindo na vida.
Penso na importância dos ritos não apenas nos ‘grandes’ acontecimentos: nascimentos e mortes físicas, casamentos, formaturas… Penso nos ritos não como formas necessariamente religiosas e muito menos como eventos fabulosos e gigantescos que muitas vezes acabam se tornando mais importantes do que o próprio momento e as pessoas envolvidas.
Gosto de pensar nos ritos num nível cotidiano: celebrar e valorizar pequenos momentos que são significativos nos nossos dias. Simbolizar e marcar as pequenas mortes no nosso caminho, olhar com atenção para as mudanças e transformações, tanto as que acontecem apenas dentro da gente, quanto as que mudam as paisagens externas.
Porque acontece regularmente em nossas vidas de emoções nascerem e morrerem, de nos sentirmos renovados e destruídos, de florescermos e adoecermos.
Então, por que não celebrar, mesmo que sozinho, um amor novo que nasceu no peito? Um dia de ‘aniversário’ que ninguém nos deu parabéns, mas a gente se sente renascendo? Um casamento de corações que mutuamente se entregaram?
Por que não passar um dia sorrindo, escrever umas palavras para expressar a beleza disso, enfeitar a casa de flores, comprar um novo vestido?
Criar o nosso próprio rito para expressar o nosso momento.
E por que não também simbolizar o fim de um namoro, ou a morte de um sentimento, o esfacelamento de uma história, o rompimento de uma ilusão, a frustração de algo não feito?
É bom também viver o luto, tirar do coma e transformar em cinzas ideias e afeições, simbolizar algo que morreu para que possamos fazer o nosso rito de passagem. Rasgar uma foto, chorar no travesseiro, fazer uma oferenda, mudar os roteiros do pensamento e as músicas da playlist seguir em frente, deixando novos ventos varrer a alma.
Que a gente saiba nascer com alegria e reconhecer e aceitar as mortes e que os ritos sejam uma forma de simbolizar e valorizar a consistência da nossa história e a importância da nossa vida.