Quando o gostar vira uma estória feita de cascatas de sensações arrebatadoras…
Acabamos de nos conhecer. O eu de um e o do outro são enigmas mútuos. A gente começa a conversar sobre coisas triviais. Trazemos de volta muitas memórias. As estórias de um criam pontes com as estórias do outro. A conversa vira um misto de expressões de surpresa, satisfação e encantamento. Um jogo de similar curiosidade!
Pouco a pouco vamos nos sentindo menos estranhos. Os sinais que cada um emite sem mesmo ter consciência deles, tornam o ritmo das coisas mais fluido e o outro mais familiar parece em certos aspectos. Existe uma genuína inclinação para que o encontro se desdobre em outros, outras possibilidades de trocas, afinidades, descobertas, emoções…
Nos despedimos no hoje, sentindo bem estar com o outro. Felizes, enriquecidos, preenchidos por novas atmosferas. É o nascimento de um novo relacionamento que nos parece promissor e já comporta expectativas que nos deixam positivamente inquietos, mais no mundo da lua do que com os pés no chão.
Passamos a viver a ansiedade do próximo encontro. E aí, quando os olhos se cruzam, sentimos vontade de sorrir, de abraçar, viver todas aquelas boas sensações da última vez… tudo de novo! Quão bom seria se o tempo se congelasse, pensamos, para que pudéssemos deixar estes instantes tão sedutores marinando, tornando-os duradouros o bastante para permanecermos mergulhados no meio de tudo aquilo que nos levasse a sentir entusiasmados, lisonjeados, desarmados, amados, fecundos, nutrizes, admirados e fascinados…
Nossos sentidos estão em alerta na presença desta pessoa que nos faz sentir já em casa. Nossas pupilas se dilatam, o coração bate um pouco mais forte, a escuta mais atenta, a mente mais sincronizada em entender e capturar o que fica no ar, nas entrelinhas. As vezes o rosto enrubesce e as mãos suam um pouco. É sorriso, é brilho no olhar, gestos amplos, generosos, acolhedores, continentes.
Estamos inclinados a contemplar, querer a outra pessoa prá gente, para nossa vida, essência, experiências, vivências… Partilhamos aquilo que gostamos, agradamos com presentes, flores, chocolates, convites para um cinema, um restaurante, uma caminhada no parque, uma noite para dançar. O levamos em casa, mostramos o mundo do nosso quarto, apresentamos a mãe. A gente gosta de elogiar o outro, fazer o outro se sentir especial, querido, enviamos emails, whatsapps, cartas. Revelamos o que apreciamos nele. Ao telefone, rimos à toa com pequenas bobagens.
Quando o outro sofre, queremos estar lá, dando apoio, aconselhando, ouvindo, abraçando, encorajando, dando o ombro, o colo, não deixando o outro perder a fé nele mesmo, na vida e nas pessoas. Ficamos perto na palavra e no silêncio. Agora entendemos através de olhares. O vínculo de confiança se fez… Os segredos converteram-se em confissões. O outro tornou-se parte do nosso endereço, nossa agenda telefônica, computador, dias, tardes, noites, rodas de conversa, personagem de nossos pensamentos, destinatário de nossos afetos e ator principal de nossos sonhos.
Neste tipo de relação existe a convergência de muitos sentimentos, como admiração, companheirismo, respeito, confiança, generosidade, vontade de ver o outro bem, de pertencer, de se doar, de construir junto algo que dê um senso de alegria, propósito, compromisso, continuidade, enriquecimento interno mútuo.
Cada nova oportunidade de encontro desencadeia uma gama de sentimentos dos mais arrebatadores e diversos. É mental, espiritual e visceral. Tocar o outro, segurar a mão do outro, dar um beijo, um abraço, afagar o cabelo, causam sensações que nos torna enternecidos. Queremos seduzir, cativar, encantar. Fazer o outro se sentir, com se diz, “a última bolacha do pacote”!
As vezes, nesta troca de afeto, outros sentimentos nascem. A amizade inicial converge em outros caminhos. Vira atração física. Queremos olhar mais perto, nas menores singularidades e em todas as pluralidades. Nos inclinamos a contemplar os lábios e começamos a pensar sobre um beijo mais ousado. No abraço, a proximidade com o corpo do outro é lida de um jeito novo. O toque da pele é sentido numa voltagem mais alta. Queremos continuar acariciando, sentindo a textura, a energia, a eletricidade, o perfume que emanam do outro. Nosso padrão respiratório muda. Fica mais irregular, assim como os batimentos cardíacos. O outro faz acordar muitas partes de nós. Agora não queremos só segurar a mão, dar um beijo só na maçã do rosto, só um abraço breve. Buscamos no toque uma proximidade maior com o universo do outro nas suas múltiplas dimensões…
Vem devagar o beijo na boca. Agora passamos a sentir o sabor do outro e partilhar o nosso com ele. Os olhos fechados. O tempo e o mundo se resumem aos movimentos dos lábios conversando sem palavras. As mãos acariciam os cabelos, as costas, o pescoço, o rosto. Os batimentos cardíacos batem recordes de aceleração. A temperatura do corpo sobe. Algumas outras partes ficam mais sensíveis a este ritual de cascatas de metamorfoses emocionais. O desejo se intensifica. É a procura por descobrir o outro nos detalhes, em cada reta, curva, ângulos obtuso e oblíquo. Cabeças, braços, troncos, pernas, expressões orbitam ao redor da existência do outro. O encontro se faz íntimo, vira uma entrega absoluta.
O corpo está agora mergulhado num redemoinho de reações químicas, elétricas, físicas… Os hormônios espalham sinais por toda a parte, orquestrando a interação do lado de fora com o mundo de dentro. Esta união vira um compasso de harmonia perfeita. O toque desencadeia alegria, relaxamento, prazer, uma atração irresistível de se estar junto, pertencendo como nunca, interpretando o outro na gente, nas sensações que ele nos desperta. É uma fusão de quereres, desejos, gostares, olhares… tudo aumentado à décima potência!
A reação do corpo ao toque revela o que o outro significa para nós neste encontro sensorial, mental, emocional e de almas. Durante estes momentos, transcendemos para o que as palavras já não conseguem mais traduzir…
O gostar e os seus temperos têm destas coisas, destas magias, destes encantamentos… coisas que a gente nunca mais esquece, que dentro de nós viram capítulos de vida recheados de incríveis enredos, fazendo nascer novos personagens na gente, cheios de significados. É como a correnteza de um rio se multiplicando em novas vertentes para se desdobrar em outras possibilidades de expansão da sua própria essência!
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